O Conflito como ferramenta de crescimento e perenidade sustentável

Este artigo foi inspirado no texto de Ricardo Guimarães, da Thymus Upframing, que destaca a importância da relação das pessoas com o conflito em uma cultura de agilidade e inovação eu já havia abordado esse assunto aqui, mas sobre uma perspectiva menos particular. Ricardo Guimarães afirma em seu post: “O sucesso de uma cultura de agilidade e inovação depende vitalmente da relação das pessoas com conflito, em particular com o conflito entre a conformidade e a inovação. O conflito é essencial para garantir uma cultura viva que promove o debate, desperta novas ideias e combate a estagnação, uma cultura de evolução enfim. […] Se a liderança vê conflito como algo ruim a ser evitado e reprimido, em geral predomina uma cultura de conformidade e obediência.

Sob essa perspectiva, é possível considerar como as organizações podem incorporar o conflito como parte estratégica na busca pela “perenidade sustentável”. Nesse contexto, perenidade não se resume à sobrevivência, mas implica um crescimento contínuo apoiado por uma cultura que valoriza a resolução criativa de tensões e desafios. Para que isso seja possível, é essencial que a liderança adote uma abordagem proativa: um líder, amparado por sua autoridade, tende a enxergar o conflito como uma oportunidade de aprendizado e solução, enquanto o gestor pode preferir evitá-lo, percebendo-o como um empecilho às metas ou propósito da empresa.

Nota: Perenidade sustentável aqui deve ser compreendida como uma etapa sistêmica, já que a junção das duas palavras busca reforçar o equilíbrio no longo prazo, considerando aspectos sociais, econômicos e ambientais.

O Conflito como Motor de Evolução Organizacional

Organizações que buscam perenidade sustentável não podem se dar ao luxo de ignorar o conflito. Ele é, na verdade, um sinal de que há espaço para avanços. Quando lidado de forma consciente, o conflito fomenta a criatividade e permite às lideranças identificar áreas de melhoria que poderiam passar despercebidas em um ambiente excessivamente harmônico, que pode ler o conflito como algo ruim.

Vou usar uma comparação já bem clichê que é da lagosta, que precisa abandonar sua casca rígida e enfrentar o desconforto para crescer (sair da zona de conforto). No entanto, enquanto a insatisfação pode ser vista como um estado de desconforto inicial, o conflito vai além: ele envolve a colisão de ideias, objetivos ou valores que demandam resolução e aprendizado. O conflito desafia diretamente o status quo e exige ação e reflexão estruturadas, enquanto a insatisfação pode ser superada sem necessariamente provocar mudanças significativas. A lagosta irá continuar a ser o que ela é, mesmo que agora maior e em uma nova armadura. É nesse confronto com o desconforto, especialmente nos cenários de conflito, que se encontram as bases mais profundas para a evolução organizacional.

No entanto, a maneira como o conflito é abordado diferencia culturas organizacionais resilientes de culturas conformistas. Em uma organização liderada por pessoas que veem a tensão como uma oportunidade de aprendizado, a diversidade de ideias não é apenas tolerada, mas ativamente incentivada. Tal postura resulta em maior agilidade na resposta a mudanças de mercado, como destacou Guimarães ao afirmar que a agilidade é sustentada por pessoas alinhadas à estratégia, com autonomia de pensamento.

Liderança e a Valorizacão do Conflito

Um líder que compreende o valor do conflito não apenas permite, mas promove espaços para debates e discussões saudáveis. Ele sabe que os desconfortos originados da divergência são, muitas vezes, catalisadores para soluções inovadoras e motores à ação. Por outro lado, gestores que evitam o confronto tendem a criar um ambiente de estagnação, onde a criatividade é reprimida em nome da “paz”.

Isso é particularmente importante em tempos de alta competitividade e constante transformação digital. Organizações que se recusam a confrontar suas ineficiências ou adaptar-se às demandas contemporâneas correm o risco de se tornarem irrelevantes.

Construindo uma Cultura de Evolução

Promover a harmonia dos opostos em um ambiente organizacional não significa evitar tensões, mas integrá-las como parte do processo de tomada de decisão. O conflito deve ser tratado como um ativo, não como um passivo. Isso requer um compromisso claro das lideranças em cultivar uma cultura de aprendizado e de abertura ao diálogo.

No livro Aprender a partir do conflito. Conflitologia e educação, da editora Graó, sua leitura nos revela um compreensão que traduzo aqui de que “o conflito bem gerido não é um sinal de desordem, mas de maturidade“. Essa visão reforça que as organizações mais eficazes são aquelas que entendem que o enfrentamento de ideias gera avanços significativos, especialmente quando há um esforço conjunto para integrar as diferenças em soluções práticas.

Além disso, os autores nos ajudam a perceber que “educar para o conflito” é uma prática essencial não apenas para o ambiente educacional, mas também para o corporativo. Essa abordagem sugere que lideranças devem ser treinadas para lidar com tensões de forma construtiva, criando um ambiente onde todos se sintam seguros para compartilhar perspectivas divergentes.

A abordagem descrita por Guimarães é, portanto, uma chamada para a reflexão organizacional: é possível ser perene sem abraçar o conflito como ferramenta de crescimento? A resposta é clara. Apenas organizações que transformam tensões em criatividade e aprendem com a diversidade de perspectivas estão verdadeiramente preparadas para o futuro.

Por fim, como mencionado no livro Aprender a partir do conflito. Conflitologia e educação, “os conflitos não costumam se fundamentar exclusivamente na diferença de critérios, interesses, formas culturais ou nacionais. Eles emergem de origens diversas relacionadas com a nossa maneira de compreender a vida e o mundo, com questões de saúde, formas organizativas que adotamos, e até mesmo erros que cometemos e não conseguimos solucionar.

Essa perspectiva nos convida a repensar o papel dos conflitos em nossas vidas e organizações já que sua origem está na forma como nos relacionamos conosco e com as pessoas e também compreendemos “as coisas”. Em vez de buscarmos evitá-los, devemos reconhecer que eles podem ser fontes de aprendizado e crescimento. A verdadeira perenidade das organizações e das relações não está na ausência de desafios, mas na capacidade de enfrentá-los e evoluir a partir deles. Assim, organizações que promovem uma cultura de evolução contínua encontram no conflito não um inimigo, mas um aliado indispensável para prosperar em um mundo em constante mudança.

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